domingo, dezembro 16

A JUSTIÇA DE YERNEY

O velho Sitar tinha acabado de ser enterrado. Deus o tenha em descanso! Era um fidalgo! Os sinos pararam de tocar; o padre tirara os paramentos funerários e o cortejo fúnebre dirigiu-se para a estalagem. Lá em Sterzhinar`s, sentaram-se à volta da mesa comprida, envoltos em luto, sérios e pensativos, as mulheres com sinais de lágrimas nos olhos. O feitor Bartholomew, alto, velho e grisalho, sentou-se no banco junto à janela; limpou a testa com o seu lenço vermelho e suspirou:
«Todos temos de partir; eu serei o próximo.»
A seguir foi a vez do filho de Sitar:
«Ah, bom, Yerney, estás aí sentado, cómodo e confiante, como se fosses o patrão. Quem é o herdeiro: tu ou eu? Foste o primeiro a falar, apesar de não estares em primeiro lugar.»
Yerney sorriu e olhou bem-humorado para o jovem.
«Foste sempre trocista, Tony, e ainda estás a bricar comigo. É bom que não cedas à mágoa: as lágrimas são para as mulheres; e o vinho para os homens.»
Encheu um copo de vinho e levou-o à boca, mas ninguém o acompanhou.
Antes que lhe tivesse tocado os lábios, Yerney retirou o copo e pô-lo em cima da mesa. Boquiaberto, olhou para o patrão, para a sua família; e apenas viu caras sombrias.
«Bom! O que é que se passa?»
Não houvera olhos nem lábios que lhe respondessem e Yerney sentiu que algo frio e pesado lhe assaltou o coração.
«Que se passa? Será que me acho no meio de ciganos ou marchantes, que me olham sem dizer palavra? Será que estou no meio de familiares ou de patifes congeminando para me armarem uma cilada?»
«Feitor», respondeu Sitar, «não nos chames esses nomes! Estás bêbado ainda antes de beberes.»

Cankar, Ivan in A JUSTIÇA DE YERNEY edição Cavalo de Ferro



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