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terça-feira, abril 19

A Frase

Primeiro sê livre; depois pede a liberdade.

domingo, abril 20

De aqui a pouco acaba o dia

De aqui a pouco acaba o dia.
Não fiz nada.
Também, que coisa é que faria?
Fosse o que fosse, estava errada.




De aqui a pouco a noite vem.
Chega em vão
Para quem como eu só tem
Para o contar o coração.




E após a noite a irmos dormir
Torna o dia.
Nada farei senão sentir.
Também que coisa é que faria?



Fernando Pessoa

sexta-feira, março 21

Dia Mundial da Poesia

GLOSAS


Toda a obra é vã, e vã a obra toda.
O vento vão, que as folhas vãs enroda,
Figura o nosso esforço e o nosso estado.
O dado e o feito, ambos os dá o Fado.


Sereno, acima de ti mesmo, fita
A possibilidade erma e infinita
De onde o real emerge inutilmente,
E cala, e só para pensares sente.


Nem o bem nem o mal define o mundo.
Alheio ao bem e ao mal, do céu profundo
Suposto, o Fado que chamamos Deus
Rege nem bem nem mal a terra e os cus


Rimos, choramos através da vida.
Uma coisa é uma cara contraída
E a outra uma água com um leve sal.
E o Fado fada alheio ao bem e ao mal.


Doze signos do céu o Sol percorre,
E, renovado o curso, nasce e morre
Nos horizontes do que contemplamos
Tudo em nós é o ponto de onde estamos.


Ficções da nossa mesma consciência,
Jazemos o instinto e a ciência
E o Sol parado nunca percorreu
Os doze signos que não há no céu.

Pessoa, Fernando in Poesias Inéditas, Colecção Poesia Edições Ática

sexta-feira, março 7

PROVINCIANO

"Se há características que imediatamente distinga o provinciano, é a admiração pelos grandes meios. Um parisiense não admira Paris; gosta de Paris. Como há-de admirar aquilo que é parte dele? Ninguém se admira a si mesmo, salvo um paranóico com o delírio das grandezas. Recordo-me de que uma vez, nos tempos da Orpheu, disse a Mário de Sá-Carneiro: "V, é europeu e civilizado, salvo em uma coisa, e nessa V. é vítima da educação portuguesa, V. admira Paris, admira as grandes cidades. Se V. tivesse sido educado no estrangeiro, e sob o influxo de uma grande cultura europeia, como eu, não daria pelas grandes cidades. Estavam todas dentro de si."
Fernando Pessoa, in OS PORTUGUESES, edições Alma Azul

terça-feira, janeiro 15

No fim da chuva e do vento


Para a Catarina



No fim da chuva e do vento
Voltou ao céu que voltou
A lua; e o luar cinzento
De novo, o branco, azulou.



Pela imensa constelação
Do céu dobrado e profundo,
Os meus pensamentos vão
Buscando sentir o mundo.



Mas perdeu-se como uma onda
E o sentimento não sonda
O que o pensamento vale.
Que importa? Tantos pensaram
Como penso e pensarei.


Fernando Pessoa

domingo, janeiro 6

O LOUCO

E fala aos constelados céus
De trás das mágoas e das grades
Talvez com sonhos como os meus…
Talvez, meu Deus!, com que verdades!



As grades de uma cela estreita
Separam-no de céu e terra…
Às grandes mãos humanas deita
E com voz não humana berra…

Fernando Pessoa



domingo, outubro 28

Frase do Dia


Adoramos a perfeição, porque não a podemos ter; repugna-la-íamos, se a tivéssemos. O perfeito é desumano, porque o humano é imperfeito.

Fonte: "Livro do Desassossego"
Tema: Perfeição

quarta-feira, outubro 24

Frase do Dia


O meu passado é tudo quanto não consegui ser. Nem as sensações de momentos idos me são saudosas: o que se sente exige o momento; passado este, há um virar de página e a história continua, mas não o texto.

Fonte: "Livro do Desassossego"
Tema: Tempo

sábado, outubro 20

Frase do Dia


"A maioria pensa com a sensibilidade, eu sinto com o pensamento. Para o homem vulgar, sentir é viver e pensar é saber viver. Para mim, pensar é viver e sentir não é mais que o alimento de pensar."

Fonte: "Livro do Desassossego"
Tema: Pensamento

segunda-feira, julho 23

...

O entusiasmo é uma grosseria.
A expressão do entusiasmo é, mais do que tudo, uma violação dos direitos da nossa insinceridade.
Nunca sabemos quando somos sinceros. Talvez nunca o sejamos. E mesmo que sejamos sinceros hoje, amanhã podemos sê-lo por cousa contrária.
Soares, Bernardo in Livro do Desassossego

domingo, julho 22

...

Por degraus de sonhos e cansaços meus desde a tua irrealidade, desce e vem substituir o mundo.

Soares, Bernardo in Livro do Desassossego

sábado, março 24

MANEIRA DE BEM SONHAR

Com este sonhar tudo, tudo na vida te fará sofreres mais,
Será a tua cruz.
Pessoa, Fernando, in O LIVRO DO DESASSOSSEGO, edições ASSÍRIO & ALVIM

sábado, março 3

Fito-me

Fito-me frente a frente.
Conheço que estou louco.
Não me sinto doente.
Fito-me frente a frente.



Evoco a minha vida.
Fantasma, quem és tu?
Uma coisa erguida.
Uma força traída.



Neste momento claro,
Abdique a alma bem!
Saber não ser é raro.
Quero ser raro e claro.




Fernando Pessoa in Poesias Inéditas, edições Ática

sábado, fevereiro 24

Não tragas flores

Não tragas flores, que eu sofro…
Rosas, lírios, ou vida…
Ténue e insensível sotro
O céu que não se olvida!

Não tragas flores, nem digas…
Sempre há-de haver cessar…
Deixa tudo acabar…
Cresceram só ortigas.


Pessoa, Fernando
in POESIAS INÉDITAS, EDIÇÕES ÁTICA

terça-feira, janeiro 30

Depois que todos foram

Depois que todos foram
E foi também o dia,
Ficaram entre as sombras
Das áleas de ermo parque
Eu e a minha agonia.
A festa fora alheia
E depois que acabou
Ficaram entre as sombras
Das áleas apertadas
Quem eu fui e quem sou.
Tudo fora por todos.
Brincaram, mas enfim
Ficaram entre as sombras
Das áleas apertadas
Só eu, e eu sem mim.
Talvez que no parque antigo
A festa volte a ser.
Ficaram entre as sombras
Das áleas apertadas
Eu e quem sei não ser.


Pessoa, Fernando in Poesias Inéditas
(1919-1930), Colecção Poesia - Edições Ática

sábado, janeiro 27

A lembrada canção...

A lembrada canção,
Amor, renova agora.
Na noite, olhos fechados, tua voz
Dói-me no coração
Por tudo quanto chora.
Cantas ao pé de mim, e eu estou a sós.

Não, a voz não é tua
Que se ergue e acorda em mim
Murmúrios de saudade e de inconstância,
O luar não vem da lua
Mas do meu ser afim
Ao mito, à mágoa, à ausência e à distância.
Não, não é o teu canto
Que como um astro ao fundo
Da noite imensa do meu coração
Chama em vão, chama tanto…
Quem sou não sei… e o mundo? ...
Renova o amor, amor, a antiga e a vã canção.
Cantas mais que por ti,
Tua voz é uma ponte
Por onde passa, inúmero, um segredo
Que nunca recebi –
Murmúrio do horizonte,
Água na noite, morte que vem cedo.
Assim, cantas sem que existas.
Ao fim do luar pressinto
Melhores sonhos que estes da ilusão.
Pessoa, Fernando in Poesias Inéditas
(1919-1930), Colecção Poesia - Edições Ática